O Presidente de Angola, João Lourenço, defendeu hoje uma reformulação da composição do Conselho de Segurança das Nações Unidas, propondo a entrada de representantes africanos e sul-americanos para “reflectir o justo equilíbrio geoestratégico mundial”.
Falando na Assembleia-Geral das Nações Unidas, que decorre esta semana em Nova Iorque, João Lourenço defendeu uma “reforma profunda da ONU para melhor competir com as grandes responsabilidades que tem na gestão e resolução de conflitos e prevenção das guerras” e vincou a necessidade de reformular o Conselho de Segurança.
“Reiteramos a necessidade de alargar os membros permanentes do Conselho de Segurança para contemplar África e a América do Sul, pelo facto de a actual composição que colocou as potências vencedoras da Segunda Guerra Mundial já não reflectir a necessidade de um mais justo equilíbrio geoestratégico mundial”, vincou o chefe de Estado angolano.
Numa intervenção onde chamou a atenção para a necessidade de optar pelo multilateralismo, “porque só ele contribui efectivamente para a paz e segurança mundiais”, João Lourenço elencou a península coreana, o Médio Oriente e o Golfo Pérsico como regiões problemáticas, exortando a ONU e a União Africana a dedicarem-se mais à Líbia.
“A ONU e a União Africana devem emprestar mais atenção à necessidade de normalizar a situação política na Líbia, pelo facto de os grupos terroristas controlados pelas diferentes milícias serem a fonte de abastecimento logístico dos grupos fundamentalistas que actuam no continente”, disse João Lourenço.
“África vem sendo assolada pelo terrorismo, sobretudo de cariz fundamentalista religioso, em países como o Mali, Níger, Nigéria, Camarões, Burkina Faso, Chade, República Centro-Africana e Somália, para citar apenas alguns”, apontou.
Apelando ao fim do embargo a Cuba e ao fim da guerra comercial entre os Estados Unidos e a China “pelas consequências nefastas que já se fazem sentir na economia mundial”, João Lourenço deixou ainda uma palavra sobre o meio ambiente, antes de defender o investimento estrangeiro em Angola.
“Os exemplos concretos do fenómeno das alterações climáticas e do aquecimento global multiplicam-se pelo mundo fora, o que nos leva a associar-nos aos que denunciam a irresponsabilidade dos que persistem em ignorar esses sinais e se acham no direito de financiar as indústrias poluentes”, disse o Presidente de Angola.
Sobre o país, Lourenço destacou brevemente, no final da intervenção, que “Angola está aberta ao mundo, ao investimento estrangeiro em todos os domínios da economia”, e exemplificou com as cerca de 150 privatizações que vão ser lançadas para sustentar que o Governo “encara os desafios de forma bastante séria e transparente”.
Eis, na íntegra, o discurso de João Lourenço
«D o alto desta importante tribuna, saúdo a todos os presentes, com votos de que este encontro constitua mais um passo decisivo na procura da paz e da segurança internacional e de uma relação mais justa e equilibrada entre todas as nações.
Os conflitos político-militares e as enormes desigualdades económicas ainda existentes representam uma ameaça permanente a toda a Humanidade, o que nos leva a nos unirmos num esforço comum na resolução dos problemas reais que constituem as nossas prioridades, como a protecção do Ambiente e a erradicação definitiva da fome e da pobreza, das doenças endémicas, do tráfico de pessoas e drogas, da imigração ilegal, do terrorismo e de outros atentados à paz, criando o ambiente adequado ao progresso social e ao desenvolvimento.
Para se cumprir esse nobre desiderato, importa concentrar todo o nosso empenho na resolução pacífica dos conflitos, que levam alguns países a um clima permanente de tensão ou de guerra iminente.
Defendemos o multilateralismo nas relações internacionais, pois só ele contribui efectivamente para a paz e segurança mundiais.
Assim, nunca é demais insistir na necessidade de uma reforma profunda da Organização das Nações Unidas, para que possa melhor cumprir com a grande responsabilidade que tem na gestão e resolução de conflitos e na prevenção das guerras.
Reiteramos a necessidade de se alargar o número de membros permanentes do Conselho de Segurança, contemplando nomeadamente a África e a América do Sul, pelo facto de a actual composição que contemplou na altura, sobretudo as potências vencedoras da Segunda Guerra Mundial, já não reflectir a necessidade de um mais justo equilíbrio geoestratégico mundial.
A tensão prevalecente na península coreana, que continua a pôr em perigo a paz mundial, deve continuar como uma das grandes preocupações da comunidade internacional.
Encorajamos e felicitamos os esforços diplomáticos que vêm sendo feitos pelas grandes potências mundiais, nomeadamente pelos Estados Unidos da América, a Rússia e a China, no sentido de se fazer daquela parte do nosso planeta uma zona de paz e segurança.
Preocupa-nos igualmente o conflito do Médio Oriente que se vem eternizando, sendo fundamental que as sucessivas e pertinentes resoluções do Conselho de Segurança das Nações Unidas sejam respeitadas, em especial as que dizem respeito à importância da criação de um Estado palestino independente, que conviva em paz com o Estado de Israel e desenvolvam entre si normais relações de vizinhança e de cooperação económica.
Com relação à crescente tensão no Golfo Pérsico, onde se situam importantes reservas de crude ameaçadas pelo conflito latente e na iminência de pôr em perigo a segurança energética mundial, apelamos à contenção de todas as partes envolvidas e que sejam encontradas as melhores soluções à mesa de negociações.
África, nosso continente, vem sendo assolada pelo terrorismo, sobretudo o de cariz fundamentalista religioso que atinge países como o Mali, o Níger, a Nigéria, os Camarões, o Burkina Faso, o Tchad, a República Centro Africana e a Somália, para citar alguns.
A comunidade internacional e a União Africana, em particular, devem prestar atenção especial à necessidade da normalização da situação política na Líbia, pelo facto de os territórios controlados pelas diferentes milícias serem a fonte de abastecimento logístico em armas e munições dos grupos fundamentalistas que actuam em África.
Angola tem procurado dar a sua modesta contribuição na medida do possível na prevenção ou resolução de conflitos, sobretudo na região da SADC, dos Grandes Lagos ou da África Central, como foi o mais recente caso do Memorandum de Entendimento entre o Rwanda e o Uganda assinado em Luanda e que nos parece ser um passo importante na prevenção de um conflito que se estava a incubar e na iminência de eclodir.
Aproveitamos esta oportunidade para desta tribuna apelarmos ao fim do embargo económico imposto há décadas a Cuba, por ser injusto à luz do Direito Internacional, sobretudo se tivermos em conta um facto recente de uma janela de oportunidade de aproximação e de regularização das relações, voluntariamente aberta com a inédita e histórica visita de um Chefe de Estado americano a Cuba.
Permitam-me igualmente que exorte ao fim da guerra comercial que neste momento opõe duas potências económicas, os EUA e a China, pelas consequências nefastas que já se fazem sentir na economia mundial.
O mundo assiste impotente ao fenómeno das alterações climáticas e do aquecimento global, que se tem vindo a agravar como comprovam os mais recentes estudos científicos e o aumento galopante dos fenómenos naturais e suas consequências devastadoras, com o proliferar um pouco pelo mundo fora de uma série de tufões, ciclones, tsunamis, cheias ou ainda secas severas.
Os exemplos concretos desse fenómeno multiplicam-se pelo mundo fora, o que nos leva a associarmo-nos àqueles que denunciam a irresponsabilidade dos que persistem em ignorar esses sinais e se sentem no direito de continuar a sustentar indústrias poluentes.
Saudamos a iniciativa da realização recente de manifestações em centenas de países pelo mundo fora e que se constituíram num verdadeiro cordão humano em defesa da preservação do Ambiente em prol da defesa do planeta, nossa casa comum.
Trabalhemos em conjunto pela preservação das florestas tropicais ainda existentes na América do Sul, em África e na Ásia, caso das florestas das bacias do rio Amazonas e do rio Congo ou Zaire, que não tendo sido ainda totalmente devastadas pelo Homem, são das últimas reservas renovadoras do oxigénio e absorvedoras do dióxido de carbono e do cloro-fluor-carbono, ambos destruidores da camada de ozono.
Os Objectivos do Desenvolvimento Sustentável, que pretendem dar continuidade aos Objectivos do Desenvolvimento do Milénio, apesar de nobres e justos, mesmo assim não são por si só a garantia de melhores resultados no futuro.
Para se alcançar o desejado desenvolvimento sustentável, importa que os objectivos contidos nessa agenda possam ser alvo de um salutar confronto de ideias em torno de projectos alternativos, adequados à situação política e à realidade concreta dos países que deles mais necessitam.
Os conflitos, a fome, a miséria e a doença não se eliminam apenas com soluções políticas e burocráticas, mas também através da boa governação, do combate à corrupção e outros males sociais, da defesa do Ambiente e do reforço de valores como a dignidade humana, a cidadania responsável e inclusiva, a justiça social e a igualdade de oportunidades.
Nesse âmbito, importa salientar o papel reservado à juventude, a única força motriz capaz de vencer todos os desafios.
É importante que se aprofunde a qualidade da sua educação, no plano técnico e cultural, para que a sua formação específica não deixe de levar em conta o contributo dos grandes homens das diferentes culturas e civilizações, que ao longo dos séculos nos ajudaram a compreender e a amar o mundo e os nossos semelhantes.
É com esperança no empenho dessa juventude que mantenho o optimismo e continuo a acreditar que podemos legar um mundo melhor aos nossos descendentes.
Falando de Angola em particular, gostaria de destacar as profundas reformas em curso que têm como objectivo construir de facto um Estado democrático de direito, combater a corrupção e a impunidade, promover a cultura da responsabilização e prestação de contas pelos servidores públicos, criar um ambiente de negócios mais atractivo ao investimento privado nacional e estrangeiro e, deste modo, aumentar a produção interna de bens e de serviços, reduzir as importações de bens de primeira necessidade, aumentar o leque e a quantidade de bens exportáveis e aumentar a oferta de emprego.
O Executivo encara todos estes desafios com bastante seriedade e transparência.
Entre outras medidas, estão em processo de privatização cerca de centena e meia de empresas e activos públicos de diferentes sectores da economia incluindo o petrolífero, e lançámos um ambicioso plano de construção e reabilitação de infraestruturas de produção e distribuição de água e energia, construção de hospitais e estabelecimentos de ensino, reparação de vias secundárias e terciárias e outras e que vão abranger a totalidade dos 164 municípios do país, tendo já o orçamento assegurado para tal.
Aproveitamos ainda esta oportunidade para dizer que Angola está hoje aberta ao mundo, aberta ao investimento estrangeiro em todos os domínios da nossa economia.»